Histórias de Marinheiros

Venha saber sobre as histórias dos marinheiros da expedição Voz dos Oceanos no Oceano Pacífico

A expedição Voz dos Oceanos, liderada pela família Schurmann, se iniciou em agosto de 2021 e depois de quase dois anos, os tripulantes já encheram muitas malas cheias de memórias e histórias, tanto boas, quanto nem tão boas assim. Mas para eles, é sempre um aprendizado tudo o que acontece tanto em alto-mar, quanto em suas paradas em terra e, com certeza, eles poderiam escrever grandes livros sobre essa jornada. Assim, conversamos com os tripulantes sobre suas histórias mais marcantes durante a expedição.

Heloísa Schurmann é pioneira das expedições marinhas desde a década de 1970, embarcou no início dessa jornada seguindo sua missão de espalhar conhecimento e informação sobre a questão dos plásticos nos oceanos. Formiga, como é conhecida por muitos, não fazia ideia do que iria encontrar pela frente em termos da missão de buscar soluções para esse desafio. Segundo ela, depois de um ano e meio, o que a mais marcou foi a quantidade de dejetos plásticos que foram encontrados pelos tripulantes em todas as praias do Brasil e passando por seis países até chegar na Polinésia (onde eles se encontram hoje). Ou seja, em todas as praias, rios, mangues e lugares que velejaram, sempre havia plástico e microplásticos. E para ela era chocante que naquelas ilhas lindas e afastadas que geralmente pensamos encontrar o “Paraíso”, havia aquela quantidade absurda de plástico.

Por outro lado, a velejadora confessa que se impressionou de forma muito positiva com a quantidade de organizações, pessoas, pescadores e até mesmo das pequenas vilas que estão buscando soluções inovadoras para acabar com esse cenário.

“Na Rocinha por exemplo no Rio de Janeiro um jovem que estava fazendo um skate com Tampinha de garrafa de pet e por aí vai, em cada lugar a gente foi vendo a diferença que essas pessoas fazem na transformação. Foi uma coisa muito linda porque a gente diz que tem muito lixo, mas o que é que as pessoas estão fazendo? Então para mim o que mais me impressionou foi a esperança, de que as pessoas estão ada vez mais engajadas em mudar a sua atitude, não só no dia a dia, mas também trazendo outras pessoas para se conscientizarem cada vez mais.” Heloísa finaliza dizendo que devemos realmente mudar os nossos hábitos para termos um oceano como gostaríamos.”

Wilheim Schurmann, o Capitão da expedição, também fez o seu relato.

“Uma das experiências mais marcantes para mim foi no Rio Amazonas. Nunca tínhamos subido uma magnitude de um Rio que nem aquele, e essa subida durante os 2 meses foi algo extraordinário e completamente diferente do que estou acostumado. A gente já enfrentou lugares rasos, lugares com um mar gigante, na Antártica com muito frio extremos, lugares com calor extremo, de diferentes condições. Mas nunca tínhamos presenciado subir uma Floresta de uma magnitude como é a Floresta amazônica, então foi realmente algo impressionante.”

Érika Ternex, que é chef de cozinha nas águas e esposa do capitão Wilheim e está desde o início dessa jornada, nos contou que todas as histórias marcantes e mais especiais da expedição, são sempre relacionadas à proximidade, encontro e possibilidade de admirar os animais.

“Nadar com os golfinhos em cocos, ver as araras passando uma em cima da outra, tubarões martelo, tubarões tigre (…), os golfinhos também em Bahamas; uma infinidade de peixes voadores na travessia do pacífico. Pudemos assistir a migração e estar no lugar de reprodução das borboletas monarcas no México, foi algo realmente muito marcante (…) Acho que para mim, a coisa mais marcante dessa expedição além da vida no barco no geral, é essa proximidade e esse privilégio de poder assistir de perto a natureza e se sentir parte dela.”

Mas não é preciso muito tempo para criar memórias inesquecíveis quando se está em alto mar, Katharina Grisotti, há 3 meses como produtora de conteúdo a bordo na expedição, já pode viver um dos dias mais marcantes de sua vida.

“O dia mais marcante da expedição para mim até agora foi quando desembarcamos em Ducie, logo depois da travessia, quando saímos de Galápagos e ficamos duas semanas até chegar na Ilha, foi uma coisa que eu nunca tinha vivido antes, e como tudo aconteceu de forma muito intensa desde que cheguei em Galápagos, quando comecei na expedição, acredito que tenha sido o momento que eu senti onde estava, no meio do oceano em uma ilha completamente isolada. Foi um momento de realização pessoal, mas também se realizar, processar que estava ali. Foi muito emocionante, chorei, senti imensamente, ver aquele atol completamente isolado, areia branca, céu azul, água turquesa e cheia de corais, pássaros lindos, um verde saturado, super forte. Foi o dia mais marcante até hoje, até o dia em que eu ver baleias esse vai ser o dia mais marcante, mas a gente espera esse dia chegar.

Alex Najas, diretor de fotografia e Carmina Renones, sua assistente representam o “por traz das câmeras” da expedição. As imagens lindas e fortíssimas que vemos nos canais Globo, OFF, e algumas em nas nossas redes sociais são feitas por ambos, que já estão há um tempo trabalhando nas águas e tem muita coisa pra contar.

“É engraçado como a gente nunca espera quando mudanças acontecem dentro da gente, eventos, pessoas, frases que mudam nossa percepção do mundo… a dificuldade de estar numa expedição como essa é que todos os dias conhecemos pessoas, visitamos lugares, vemos coisas muito impactantes, escutamos histórias únicas, mas temos pouco tempo para processar tudo isso. Contar um evento marcante é quase como procurar a agulha no palheiro, sobre o que? Sobre o impacto do plástico? Sobre a condição humana? Sobre a beleza do mundo?”. Relatou Carmina.

Alex comentou que houveram muitos momentos incríveis com os animais, lugares maravilhosos e também muito soco no estômago em situações relacionadas ao lixo. Mas conta sobre a relação de amizade que estabeleceu com Benjamin, um morador de Mangareva, onde eles puderam ficar mais tempo e se conectar de forma mais profunda com o lugar e com as pessoas.

“Aqui na cidade inclusive estou tendo oportunidade de me conectar mais com ele, um cara que eu estou me conectando um pouco mais aqui nessa expedição pelo tempo que estou aqui. Eu o conheci no colégio, ele é pai de um aluno local, e estávamos gravando uma pauta. Conversamos e tivemos várias ideais parecidas, e assim acabamos nos aproximando, tomamos uma cerveja que acabou em uma tatuagem feita por ele. É pessoa que realmente mudou a minha vida, me trouxe reflexões que só me mostraram que que as nossas intuições às vezes não estão desconectadas. Ele me mostrou aqui a vida é realmente simples na prática, e isso transformou minha vida que já vinha sido sim já havia sendo transformada ao decorrer da expedição. Mas com o tempo com Benjamin, pude expandir mais ainda”.

Carmina conta uma história que aconteceu com os dois.

“Me lembro de um dia no México, durante uma gravação na praia eu (Carmina) e Alex cruzamos com um homem que ficou nos observando de longe, depois se aproximou com aquele olhar curioso que geralmente recebemos por conta do uniforme (e da câmera) … Pra nossa surpresa ele chegou e já disse “Sabesp…li no boné, vocês são de São Paulo?” Fazia um tempo que não encontrávamos um brasileiro e ficamos super felizes de ouvir português. Papo vem, papo vai falando sobre o projeto e as iniciativas que pudemos conhecer na cidade de Puerto Morelos. Ele nos contou um pouco da caminhada dele, até que disse que morava naquela praia mesmo, embaixo de um coqueiro mais a frente e nos convidou pra visitá-lo qualquer dia, que tinha muito cocos, e queria dividi-los.

No nosso dia de folga decidimos visitá-lo na praia, Marcelo, o nome do nosso amigo. Chegando lá, ele nos recebeu com o maior sorriso, já abriu três cocos, sentamos na praia, e conversamos muito sobre várias coisas e sobre o que realmente importa na vida. Ele nos fez ceviche, comemos mais cocos, admiramos aquele mar azul e ele disse que vivia baseado em três ideias.

  1. Todos somos iguais.
  2. Tem suficiente pra todos.
  3. Você não precisa fazer nada, (mas se for fazer, faça direito, mesmo se o que você fizer não for nada, por que é difícil não fazer nada).

O problema é que as pessoas não acreditam de fato nisso, no seu interior, com sinceridade. Esse foi um dos dias que mudou minha percepção do mundo, porque no final, cada um dá o que pode.

Texto escrito por Bianca Paoleschi